A tecnologia também influencia o investimento de grandes fortunas.

Durante anos, falar sobre algoritmos e big data soou como algo para fundos quantitativos ou investidores de tecnologia. Mas a revolução tecnológica também chegou aos escritórios onde grandes propriedades são administradas. Empresas que movimentam centenas de milhões incorporam ferramentas analíticas avançadas para refinar estratégias, antecipar ciclos e detectar riscos. A tecnologia não é mais apenas uma promessa para pequenos investidores ; tornou-se também um aliado silencioso — e cada vez mais influente — dos ricos.
No private equity, onde as informações são limitadas e os ciclos de investimento são altamente complexos, "aplicar modelos de previsão permite maior precisão e controle ", diz Carlos De Andrés Pérez, diretor de gestão de ativos da BlueBull. Sua equipe desenvolveu um banco de dados proprietário com mais de 10.000 fundos classificados por estratégia, tipo ou geografia, aos quais aplicam algoritmos de aprendizado de máquina para antecipar como as variáveis macroeconômicas afetam os fluxos de capital. Isso permite que eles adaptem cada programa aos objetivos do cliente com um nível de detalhes difícil de alcançar usando métodos tradicionais.
O uso de big data e técnicas preditivas permite um melhor ajuste da composição da carteira, a antecipação de cenários complexos e a justificativa de cada decisão, explica José Manuel España, diretor de gestão de ativos e gestão de patrimônio da NTT DATA. Essa combinação de análise e estratégia fortalece a eficiência operacional e melhora tanto a lucratividade quanto a percepção da robustez do serviço.
Embora outros setores tenham feito rápido progresso na integração tecnológica, o capital privado muitas vezes ainda opera sob estruturas análogas, alerta Carlos De Andrés Pérez, diretor de gestão de ativos. Para ele, essa lacuna torna a inovação uma condição necessária, não apenas para competir, mas também para se adaptar a um mercado que exige cada vez mais eficiência, precisão e capacidade de resposta.
"A integração de algoritmos avançados exige dados confiáveis, modelos compreensíveis e conformidade regulatória rigorosa", alerta José Manuel España, da NTT DATA. Além do desafio tecnológico, os gestores de ativos devem superar barreiras culturais internas e atualizar suas infraestruturas para que essas soluções funcionem de forma eficaz. O sucesso depende do alinhamento da inovação com a expertise financeira, mantendo o controle em um ambiente cada vez mais automatizado.
Embora muitas empresas já tenham resolvido os desafios técnicos iniciais, ainda é necessário integrar a inteligência artificial (IA) sem comprometer o relacionamento humano que define a gestão de patrimônio, observa Justo Hidalgo, diretor de IA da Adigital.
Para conseguir isso, os algoritmos devem ser transparentes, auditáveis e aplicados dentro de estruturas éticas que reforcem — mas não substituam — o julgamento profissional e a confiança do cliente.
"A incorporação de tecnologia no private banking seguiu caminhos diferentes dependendo do perfil do cliente", afirma Carlos Contreras, membro do Instituto Espanhol de Analistas. Enquanto a inteligência artificial avançada está sendo aplicada quase invisivelmente entre os ultra-ricos, os segmentos de renda média estão se tornando mais conscientes de sua presença por meio de assistentes virtuais, relatórios digitais e processos automatizados. A ascensão da consultoria robótica é uma resposta a uma nova geração que busca agilidade, clareza e custos razoáveis sem sacrificar o suporte especializado.
“O avanço da inteligência artificial não significa o desaparecimento do aconselhamento humano , mas sim sua transformação em modelos híbridos”, acrescenta Carlos Contreras. A chave é combinar a eficiência do algoritmo com a supervisão do gerente. Quanto mais transparência essas ferramentas oferecem — sobre sua lógica ou suas limitações — maior é a confiança do cliente. Por essa razão, a abordagem "humano no circuito", na qual humanos e máquinas se complementam, está ganhando cada vez mais força.
"O cliente de alto patrimônio não é mais o mesmo", diz Andrés Dancausa, vice-presidente da SpainCap. "Hoje, exige-se acesso constante à informação, transparência e um alto grau de personalização. Muitos pertencem a uma nova geração de jovens empreendedores e profissionais globais com conhecimento digital, que valorizam tanto a eficiência tecnológica quanto o toque humano", ressalta. A demanda também está crescendo por estratégias flexíveis, com mais janelas de liquidez e diversificação, que não é mais uma recomendação, mas uma prioridade estratégica.
A Espanha está progredindo na digitalização de ativos, embora ainda esteja atrás de países como Suíça e Holanda, explica Carmen Orive, gerente da Accenture. "Muitos gestores de ativos ainda estão focados em consolidar sua arquitetura de dados, uma etapa essencial que atrasa o uso total da IA e do big data", ressalta. Em outros mercados europeus, essas ferramentas já estão sendo usadas "para refinar recomendações, detectar desvios e otimizar questões fiscais em tempo real".
"Mais do que uma questão geográfica, o ritmo de adoção da inteligência artificial depende do perfil de quem lidera as empresas de gestão de ativos", afirma Dancausa, da SpainCap. «Nos Estados Unidos, há muitas equipes com mentalidade tecnológica que estão comprometidas em crescer rapidamente com dados. Na Europa, ainda predomina uma abordagem mais financeira. Há talento e determinação na Espanha, embora a falta de escala retarde o progresso . "A mudança acabará afetando todo o setor, embora não aconteça ao mesmo tempo", ressalta Dancausa.
“Os sistemas preditivos trabalham com dados históricos, perfis de clientes e variáveis macroeconômicas”, explica Boris Delgado, Diretor de Indústria e TIC da AENOR. Para garantir confiabilidade e uso responsável, são aplicados padrões internacionais de qualidade, privacidade e rastreabilidade. “Essa tecnologia permite um planejamento de portfólio mais preciso, design personalizado de produtos financeiros e recomendações imediatas, facilitando uma tomada de decisão mais rápida e alinhada aos objetivos do cliente”, afirma.
"A IA generativa pode ser uma ferramenta útil para explicar decisões de investimento ou simular cenários hipotéticos", diz Aitor Pastor, CEO da Disia. Além da análise técnica, "sua contribuição está na melhoria da comunicação e da clareza. Notificar os clientes sobre o uso de IA não só será obrigatório, como também reforçará a transparência e a confiança, sem diminuir o papel do consultor", sublinha.
"A confiança na inteligência artificial também está crescendo no cenário de investimentos", observa Jean-Paul van Oudheusden, analista da eToro. Após um período de expectativas excessivas e correções de avaliação, os mercados estão entrando em uma fase mais realista. «Investimentos milionários continuam inabaláveis: os Estados Unidos estão reforçando seu compromisso com novas leis e projetos como o Stargate , enquanto a Ásia e os gigantes globais da tecnologia continuam avançando. A mensagem subjacente, diz ele, é que a inteligência artificial deixou de ser apenas uma expectativa e se tornou um eixo real de decisões de investimento de longo prazo", conclui.
"Embora a IA ofereça benefícios claros na gestão de patrimônio, ela também traz riscos se aplicada de forma aleatória", alerta Amadeo Alentorn, chefe de ações sistemáticas da Jupiter AM. Ele enfatiza a importância de saber em quais dados cada modelo foi treinado e evitar viés ou overfitting. Um sistema que aprende ruído em vez de padrões reais pode falhar com novos dados e levar a decisões errôneas. Portanto, lembre-se: "ele deve complementar o julgamento humano, não substituí-lo".
Tecnologia, dados e automação estão redesenhando o mapa da gestão de patrimônio, mas não substituem o essencial: entender o cliente, antecipá-lo e apoiá-lo com julgamento. A IA nos permite ir mais longe, sim, mas a diferença continuará residindo em como ela se combina com a experiência humana. O que está em jogo não é apenas eficiência, mas uma nova maneira de construir confiança em um ambiente que está mudando mais rápido do que nunca.
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