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Prémio Laranja Amarga para a promiscuidade entre gestão portuária e esperteza partidária autárquica

Prémio Laranja Amarga para a promiscuidade entre gestão portuária e esperteza partidária autárquica

As eleições autárquicas são a grande festa da democracia na qual são eleitos mais de 35 mil presidentes de câmara ou de junta, vereadores e membros de assembleias municipais ou de freguesia. Um partido que concorra aos 308 municípios e às mais de três mil freguesias tem de mobilizar, entre efetivos e suplentes, mais de 40 mil candidatos. As listas foram apresentadas nos tribunais até ontem e deveremos ter entre 200 a 250 mil candidatos numa festa da participação cívica sem paralelo em eleições legislativas ou presidenciais.

A experiência da gestão local tem o encanto e desafio da proximidade e a realização pessoal de ver resolvidos problemas concretos das pessoas com que os autarcas se cruzam todos os dias nas ruas e de quem ouvem os protestos e queixumes em registo direto.

Os resultados têm simultaneamente uma leitura política nacional, consequências na saúde partidária e uma dimensão local em que o reconhecimento dos candidatos e o desempenho dos incumbentes têm um papel fundamental. Daí dizer-se que não é fácil derrotar autarcas em funções, daí também a importância para o arejamento democrático que representou a lei da limitação de mandatos.

Se a personalidade dos candidatos pode ser determinante em pequenas localidades surpreende que mesmo nas grandes cidades os eleitores reconheçam as diferenças e distingam entre os três boletins de voto com resultados diferenciados entre partidos na eleição do presidente de câmara e de junta de freguesia e no equilíbrio político da assembleia municipal. O resultado, como sucedeu em Lisboa em 2021, pode ser um executivo minoritário de direita, uma maioria de esquerda na assembleia municipal presidida pelo PS e a aldeia gaulesa de Carnide como única freguesia da CDU.

Se as eleições são locais, já por duas vezes, em 1982 e em 2001, provocaram a demissão de primeiros-ministros e várias vezes mudanças nas lideranças partidárias. Desta vez serão, para além da dimensão local de cada uma das cerca de 3300 eleições, o primeiro barómetro depois do terramoto político de maio.

O PS precisa de ganhar, isto é, ter mais presidências de câmara do que qualquer outro partido, para manter o seu peso territorial e a presidência da ANMP como base para recuperar da derrota politicamente mais pesada de sempre.

O PSD tenta monopolizar o poder nacional acrescentando às governações central e regionais o papel decisivo do investimento público e emprego ligados às autarquias.

O Chega ambiciona os primeiros polos de poder executivo, testar que apesar da omnipresença de Ventura nos cartazes não é o partido de um homem só e derrubar a nível local a fábula do PSD de que “não é não”, com a proliferação de vereadores decisivos para formar maiorias nos executivos.

O PCP tenta sobreviver limitando as perdas de municípios e a erosão de votos daquela que ainda é a terceira força autárquica em presidências e mandatos.

O CDS faz uma temerária prova de vida na defesa das suas 6 presidências de câmara e nos poucos locais em que concorre com a própria bandeira como Sintra ou Vila Franca de Xira.

Os restantes partidos, da IL ao PAN, com débil implantação territorial, tentam fazer valer em coligações os votos que não arriscam contar sozinhos e suspiram por que estas penosas eleições passem depressa.

As candidaturas independentes são, na sua maioria, de candidatos dissidentes ressabiados com as opções que consideraram injustas dos seus partidos, salvo alguns movimentos de genuína base popular sobretudo ao nível das freguesias. Temos finalmente as tentativas de regresso de velhas glórias tentando imitar em Setúbal ou em Serpa, com antigos presidentes eleitos pelo PCP, o épico regresso do populista Rondão de Almeida a Elvas.

O caso de Setúbal é um caso muito especial de promiscuidade política e de instrumentalização do aparelho de Estado para disfarçar fraquezas eleitorais. Numa operação liderada pelo ministro das Infraestruturas e vice-presidente do PSD Miguel Pinto Luz, foi decidido que o PSD não teria candidatura em Setúbal e apoiaria a antiga presidente eleita pelo PCP entre 2009 e 2021 e candidata derrotada em Almada nas últimas eleições.

Perante a fúria do PSD local e do antigo candidato Fernando Negrão, Pinto Luz usou o Porto de Setúbal como arma partidária nomeando no final de Julho o Presidente Vítor Caldeirinha e o administrador Nuno Viterbo, que são figuras ligadas ao PSD sadino que integram as listas da “independente” Dores Meira.

Mas, por outro lado, fez uma nomeação duplamente ilegal para os Portos de Lisboa e Setúbal ao desprezar a voz das autarquias, recusando renovar o mandato do administrador indicado pelos municípios da Área Metropolitana de Lisboa, e ao indicar três homens e apenas uma mulher para a administração violando assim a lei do equilíbrio de género na gestão de empresas públicas. A nomeação é nula e deve ser corrigida no prazo de 90 dias, como diz a lei 62/2017, mas a pressa de tornar o Porto de Setúbal numa comissão eleitoral de Dores Meira é um sinal muito preocupante de instrumentalização do Estado para guerrilhas partidárias internas do PSD e para sonhar com vitórias de braço dado seja com quem for.

Pela confusão entre aparelho do partido e gestão pública e pela tentativa de ignorar a voz das autarquias da AML o Prémio Laranja Amarga de hoje vai para Miguel Pinto Luz.

Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.

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