BoCA. Nova direção da bienal é revelada no início de 2026

É um ano particular para a BoCA — Bienal de Arte Contemporânea, nascida há uma década em Lisboa. Numa altura em que se expande além fronteiras, decorrendo, pela primeira vez, entre Lisboa e Madrid, o festival que alberga projetos de áreas tão distintas como as artes performativas e visuais, a música ou o cinema vai perder o seu fundador e diretor artístico, John Romão, nomeado em abril diretor artístico da Évora 27 Capital Europeia da Cultura.
Camino Irreal, título da quinta edição do certame, pode também ser entendido como convite a imaginar o futuro de um festival que tem brindado o público com uma programação experimental e plural. Foram dez anos de efervescência criativa, de propostas que desafiaram convenções e colocaram artistas diante do risco, empurrando-os para fora da sua zona de conforto e instigando-os a explorar territórios ainda não percorridos.
Também será assim entre 10 de setembro e 26 de outubro, com espetáculos como Adilson (12 a 14 de setembro, CCB, Lisboa), fruto do desafio lançado ao músico Dino d’Santiago para criar uma ópera, ou Coral dos Corpos sem Norte (20 e 21 de setembro, Sala Estúdio Valentim de Barros, Lisboa), a estreia do angolano Kiluanji Kia Henda, artista multimédia com trabalhos que vão da instalação ao vídeo, na criação de uma peça de teatro.
John Romão, ainda na qualidade de programador da mostra, fala ao Observador com “satisfação” por “perceber que o projeto foi crescendo e que atinge agora não digo um auge, mas um momento novo de transição”. A BoCA consolidou “uma identidade muito forte”, descreve, sublinhando a importância dos “cruzamentos disciplinares”, da “relação interinstitucional bastante representativa do setor criativo” — entre teatros museus, centro culturais, cinemas e monumentos — além da encomenda de novas criações. “A BoCA deverá continuar a ter essa direção e dinâmica, certamente com alguém que entenderá essa distinção dessas características no panorama nacional e internacional”, deixa escapar. A nova direção será escolhida através de nomeação, num processo do qual Romão participa. “A ideia é que no início de 2026 possamos anunciar quem poderá ser essa pessoa”, avança ao Observador.
A 5.ª edição do festival acontece pela primeira vez entre dois países, Portugal e Espanha. Romão justifica-se com a existência de uma “dimensão ibérica que parece ainda pouco explorada”. “Faltava um projeto que pudesse ser mais representativo da cena artística ibérica, que envolvesse artistas portugueses e espanhóis, de diferentes geografias, e representações das instituições também de uma forma expandida”.
Entre materalizações desse estreitar de laços estão a curta-metragem de João Pedro Rodrigues, 13 Alfinetes, rodada entre Lisboa e Madrid e que vai estrear mundialmente no âmbito da bienal ou o desafio lançado a Elena Córdoba, coreógrafa espanhola e Francisco Camacho, coreógrafo português, para que reatassem uma relação que tinham iniciado há 10 anos, numa pequena residência artística no festival Citemor, em Montemor-o-Velho — os artistas vão fazê-lo com Uma ficção na dobra do mapa (25 de setembro em Madrid, de 27 a 28 em Lisboa).
Há ainda Palavras e gestos: para uma coleção performativa no Museu do Prado, o resultado de convites lançados a quatro dramaturgos — os portugueses Tiago Rodrigues e Patrícia Portela, a espanhola Angélica Liddell e o argentino Rodrigo García — para que explorem como é que “o teatro, a dramaturgia e a palavra podem interferir num museu de arte clássica”. “Cada criador parte de uma pintura e vai apresentar uma nova criação numa sala específica do Museu do Prado, o que desenha um percurso do público por quatro criações durante duas horas, num percurso noturno, à porta fechada”, desvenda o programador sobre o espetáculo (27 e 28 de setembro, Museo Nacional del Prado, Madrid) que será filmado e tornado numa video-instalação que chegará a Lisboa num futuro próximo.
“Interessa-nos explorar esta proximidade geográfica e cultural e, no fundo, estreitar as ligações ibéricas”, resume John Romão. Será este o início de uma BoCA verdadeiramente ibérica, agora a trilhar caminhos madrilenos? “Já não vai ser decidido por mim, mas deu-nos muito trabalho chegar até aqui”, reconhece, lembrando que muitas instituições espanholas manifestaram interesse em participar, mas ficaram de fora por questões de agenda e calendário. “Talvez uma segunda edição, ainda mais reforçada institucionalmente em Madrid, faça sentido”, admite, ressalvando, contudo, que “esse é um balanço a fazer” e que será essencial avaliar o impacto desta edição.
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