Cabo Verde quer alargar oferta no mercado de valores mobiliários

A auditora geral do Mercado de Valores Mobiliários de Cabo Verde considera que falta oferta para responder à procura de investidores e espera que o cenário melhore com a alteração ao Código do Mercado, em debate no parlamento.
“Há investidores à procura de oportunidades”, mas há um “condicionamento do lado da oferta” pelo facto de as empresas “não terem capacidade financeira, não terem capacidade de prestar informação”, por falta de contabilidade organizada, ou por não terem conhecimento sobre como se financiar através do mercado de capitais, referiu Ana Semedo em entrevista à Lusa.
O mercado vive principalmente de títulos de dívida pública (no mercado primário) e tem quatro empresas cotadas no mercado de ações, mas as ofertas públicas (banco Caixa Económica, em 2024, e banco IIB, em 2023) revelaram um potencial por desenvolver, indicou.
O valor das transações no mercado secundário saltou de 92 milhões de escudos em 2023 para 2,8 mil milhões de escudos em 2024 e o número de investidores a retalho passou de 180 para 997, lê-se no relatório anual da Auditoria-Geral do Mercado de Valores Mobiliários (AGMVM).
“Podemos dizer que [o mercado] é pequeno, comparativamente com o mercado de crédito, mas mostra bem o potencial, se tivermos mais papéis a serem transacionados no mercado secundário”, referiu.
Por isso, a proposta de reforma tenta “adaptar os critérios à realidade do país”, dominada por pequenas empresas: “por exemplo, na emissão de ações, o critério foi reduzido substancialmente de 100 para 20 milhões de escudos (de capitalização bolsista previsível ou capitais próprios), e, no caso, das obrigações de 20 para 10 milhões” de montante do empréstimo.
“Continua a ser exigente”, reconhece, mas “estes critérios, em conjunto com outros, estão entre os eixos mais importantes para promover o acesso” ao mercado, num país com tecido económico constituído sobretudo por firmas de pequena dimensão, a maioria sem contabilidade registada.
“Não podemos abrir mão das exigências em termos de prestação de contas”, sublinha, mas noutros critérios a proposta tenta abrir caminho para tornar a entrada no mercado mais acessível, disse, indicando outros aspetos da reforma.
A flexibilização de prospetos, a revisão de critérios para entidades que já têm acesso ao mercado e a criação de “segmentos mais direcionados para as pequenas e médias empresas e ‘startups’”, são outros pontos destacados pela responsável pela AGMVM.
“Somos uma economia que ainda está a crescer e há a necessidade de muito investimento em termos de infraestruturais, numa componente mais pública, mas também em termos de empresas ou de empreendimentos chave, necessários para qualquer país”, e que tornam apelativa a expansão do mercado mobiliário, apontou Ana Semedo, ao justificar a reforma que seguiu para debate na especialidade, na Assembleia Nacional, para ir ao encontro dessa procura.
“Há espaço também quando olhamos à liquidez na nossa economia”, acrescentou, apontando o caso do Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), que “tem muita liquidez, porque ainda é um sistema relativamente jovem, e que precisa de a investir de forma cuidada, mas também de forma a possibilitar que as questões de sustentabilidade sejam adiadas no tempo”.
No final, “se o mercado crescer, o cidadão comum tem a oportunidade de escolher onde alocar as suas poupanças”, com possibilidade de aceder, como investidor, a um mercado “com financiamento de bons projetos, de empresas sólidas”, mas também de beneficiar de um “potencial de crescimento de valor, de emprego e de bem-estar da população”, idealiza a responsável.
A reforma prevê ainda que se abram portas para a “regulação e supervisão de serviços com ativos virtuais que tenham características de valores mobiliários”.
“É importante porque há procura, há entidades que já estão a procurar autorização por parte da AGMVM, porque vão negociar ‘tokens’, por exemplo, em termos de unidades de participação num fundo e há essa necessidade de se estabelecerem regras” e “proteger os investidores”.
“A nossa missão é a proteção dos investidores” e, por essa via, proteger o mercado, disse, sendo que “o investimento em ativos virtuais é algo transnacional”.
“Há que ter condições de atuarmos no âmbito da cooperação” com congéneres – através da Organização Internacional das Comissões de Valores Mobiliários (IOSCO), concluiu.
A nível interno, a reforma prevê um reforço da independência, autonomia financeira e patrimonial da AGMVM.
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