Gaza: quando dar comida se torna crime de guerra

A bolha “antissionista” ( para não dizer outra coisa), qual salão de hipocrisia onde a indignação se serve em bufete selectivo, anda em sobressalto. Mais uma vez, o “regime genocida” de Israel é acusado de matar dezenas de palestinianos que procuram comida. A acusação não tem provas, não tem contexto, não tem fontes independentes. Tem apenas a assinatura habitual: Hamas, Al Jazeera, e uma comitiva de jornalistas ocidentais de serviço à causa.
A fórmula é infalível. Um grupo de homens tenta apanhar farinha, alguém dispara (ou talvez não), e os mortos aparecem logo nos telejornais, empilhados entre slogans. Se Israel está envolvido, a culpa está apurada à partida. Porque, segundo esta gente, Israel só permite ajuda humanitária para atrair os palestinianos e depois abatê-los como quem caça patos num charco. Há quem acredite. Pior: há quem propague
Na verdade, o escândalo é que alguém está a dar comida aos palestinianos, e não a vendê-la. E esse alguém não é o Hamas, nem a ONU, nem a brigada de ONGs que há décadas transformou a Faixa de Gaza numa linha de montagem de “resistência”, subsídios, relatórios e retórica piedosa. É a Gaza Humanitarian Foundation (GHF), uma organização apoiada por americanos e israelitas e, ainda por cima, eficaz. Escândalo. Crime. Provocação intolerável.
Desde 26 de Maio, esta organização distribuiu cerca de 60 milhões de refeições a palestinianos. Em média muito mais que as ONGs tradicionais em quatro décadas, se excluirmos jantares de gala da “resistência” e relambórios de queixas contra o “apartheid sionista”.
O resultado? Está a ser difamada por pôr civis em risco, acusada de “colaborar com a ocupação” e, novo clássico, responsabilizada por cada palestiniano que tropeça no caminho. A mesma imprensa que nos garantiu que o hospital de Al-Ahli tinha sido destruído por um míssil israelita (foi um da Jihad Islâmica) agora explica que os centros da GHF são “campos de morte”. A fonte? O Hamas. A prova? Uma reportagem do Haaretz com testemunhos anónimos. Ora quando um jornalista ocidental da bolha refere “testemunhos anónimos” o que está realmente a dizer é o que lhe contou um primo do primo do sobrinho de um jihadista do Hamas. Os factos? Irrelevantes.
A indústria do humanitarismo engajado anda compreensivamente em pânico. Trata-se de concorrência. A operação da GHF é uma afronta directa ao cartel da ajuda humanitária. Um cartel onde cada saco de arroz passa por dez relatórios, onde cada grama de lentilhas justifica uma cimeira em Genebra. Um cartel que se habituou a operar com uma regra simples: se não ajudar o Hamas não serve.
As 165 organizações que exigiram o encerramento da GHF não o fizeram por zelo humanitário. Fizeram-no porque estão a perder o monopólio da narrativa, estão a perder dinheiro, estão a perder visibilidade. Estão, sobretudo, a perder a máscara. Estavam habituadas a um sistema onde o sofrimento era investimento e onde a “ajuda” era medida em relatórios, financiamento e retórica. Estão, enfim, mais preocupadas com o tacho deles do com o prato dos outros. O sofrimento, para elas, não é bem um problema. É um modelo de negócio.
O argumento mais cómico vem da ONU: a GHF distribui comida em zonas controladas pelo IDF, logo, os civis correm perigo. A mesma ONU que admite que a sua ajuda é saqueada pelo Hamas, mas assegura que “não é em larga escala”, talvez apenas o suficiente para alimentar a logística do grupo terrorista. A mesma ONU, que também garantiu, olhos nos olhos, que a UNRWA era pura como a neve, não colaborava com os jihadistas, não armazenava mísseis, não ensinava o ódio nas suas escolas, nem tinha gente do Hamas na sua folha de pagamentos.
Foi o que se viu, é o que se sabe!
É a mesma ONU cujo Programa Alimentar Mundial recentemente despejou camiões de farinha no meio do nada, permitindo que a multidão se pegasse à pancada para agarrar o que conseguisse. Chamaram-lhe “autodistribuição”, um conceito que é apenas mais uma palavra pomposa para caos e cumplicidade com o Hamas. Que agradece.
O que dói a esta gente é que a GHF funciona. Montou centros organizados, com voluntários locais, sem intermediários barbudos, sem trapos da ONU. Está a alimentar pessoas. Sem recorrer ao Hamas. Com transparência. E isso, claro, não pode ser admitido.
Num gesto esclarecedor a GHF convidou as ONG’s a juntarem-se à operação, em vez de insultarem à distância. Ninguém quis. Trabalhar exige sujar as mãos, é mais fácil fazer comunicados e berrar slogans.
Há relatos de mortos em redor dos centros? Há, segundo o muito credível “Ministério da Saúde de Gaza”. O Hamas garante que os culpados são os israelitas, como quem diz que a chuva é culpa do sionismo. Israel admitiu terem ocorrido incidentes em que alguns civis foram mortos. Mas esclareceu que foram casos mínimos e que só usou fogo real quando os soldados foram ameaçados, incluindo por suspeitos fora das rotas designadas ou fora do horário de funcionamento. E disse mais: está a rever procedimentos, reforçar sinalizações, reorganizar acessos. A ONU? Segue naturalmente a narrativa do Hamas.
Mas a operação da GHF é tão incómoda que os próprios palestinianos estão a ser mortos e torturados por a aceitarem. No dia 12 de Junho, oito voluntários palestinianos foram executados por terroristas do Hamas. O crime? Estavam a distribuir arroz. Alguns foram deixados feridos, às portas de um hospital. Às portas mesmo, nem sequer os deixaram entrar. A servirem de exemplo. Eram “traidores”. Traição, em Gaza, significa salvar vidas.
O que fez o Engº Guterres? A Sra Mortágua? A “comunidade internacional”? Assobiaram para o ar. Nenhum protesto. Nenhuma resolução. Nenhuma reportagem pungente na BBC. Nenhum comentador indignado na CNN. Nenhuma manifestação com keffiyes. Para alguns, um palestiniano só vale se morrer pela narrativa certa.
A verdade inconveniente é que a operação da GHF está a secar uma das maiores fontes de poder do Hamas: o controlo da ajuda humanitária. Ao mesmo tempo, desmascara a narrativa chorosa de que Israel quer “matar os palestinianos à fome”. Ora o que Israel impede é que o atum em conserva venha com um detonador por baixo. E se mais centros da GHF abrirem no norte de Gaza, como já está previsto, isso será mais um prego no caixão da vitimização rentável.
Financiada pelos EUA, por Israel e por alguns países europeus discretos (discretos, porque apoiar Israel é blasfémia em certos círculos), esta operação está a provar que é possível ajudar sem colaborar com terroristas. E isso é intolerável para as ONG’s que se habituaram ao contrário e sentiam orgulho em participar na “resistência”.
A equipa operacional tem veteranos de organizações humanitárias, que agora atacam por estarem a fazer, imagine-se, o trabalho certo. Os pacotes alimentares não são esmolas: são apoio digno. Mas quem os recebe não grita “morte a Israel”, não aparece em campanhas da Oxfam. E por isso, não interessa.
Se houver um cessar-fogo, a operação continuará. E isso pode significar o verdadeiro fim do sequestro humanitário que o Hamas impõe à sua própria população. Quando a ajuda chega sem medo, a chantagem perde força. Quando a comida não precisa de um comandante da jihad para ser distribuída, a estrutura colapsa.
E, mais importante: quando os palestinianos perceberem que é possível viver sem a tutela do terror e da propaganda, talvez comecem finalmente a viver. E esse, é o verdadeiro perigo para quem vive do eterno conflito e do enraivecido “antissionismo”
Porque, para muitos, a paz não alimenta. A fome e a ideologia sim.
observador