Montenegro em silêncio sobre violência da extrema-direita

A Polícia Judiciária (PJ) deteve, esta terça-feira, seis pessoas por ligações ao grupo de extrema-direita e neonazi Movimento Armilar Lusitano, uma milícia fortemente armada, que segundo o comunicado da PJ “pretendia constituir-se como um movimento político”. As detenções ocorreram por estar “fortemente indiciadas” a prática dos crimes de infrações relacionadas com grupo e atividades terroristas, discriminação e incitamento ao ódio e à violência e detenção de arma proibida. Entre os detidos está um chefe da PSP que tinha já sido transferido para a Polícia Municipal de Lisboa por ligações à extrema-direita.
A notícia destas detenções surge na sequência de outros incidentes que mostram um aumento das ações violentas da extrema-direita. Desde as agressões feitas a manifestantes no desfile do 25 de Abril em Lisboa, às agressões a atores do Teatro A Barraca no 10 de junho, das quais resultou um ferido grave, passando pela notícia de que um ativista antifascista foi atacado por um elemento do grupo neonazi 1143 em Guimarães, neste fim de semana, depois de esse grupo andar a colar autocolantes nas casas onde vivem pessoas identificadas como antifascistas ou imigrantes, ou as agressões a voluntários que distribuíam comida a imigrantes no Porto.
A sucessão de notícias ligadas ao que parece um recrudescimento da violência praticada pela extrema-direita acontece depois de no último Relatório de Segurança Interna (RASI) ter sido apagado um capítulo inteiro sobre estes fenómenos extremistas, sem que tenha sido para isso dada uma explicação cabal por parte do Governo, apesar dos pedidos de vários partidos da oposição.
“Não somos racistas, os senhores é que estão ultrapassados”, reagiu VenturaJorge Pinto, deputado do Livre, levou o tema ao debate sobre o Programa do Governo, fazendo uma relação direta entre o aumento da violência da extrema-direita e o crescimento eleitoral do Chega. Uma alegação que lhe valeu fortes protestos da bancada do partido de André Ventura e uma admoestação de Teresa Morais, que estava a presidir à sessão e que lhe recordou que o Chega é um partido democraticamente eleito.
“Não somos racistas, os senhores é que estão ultrapassados”, reagiu Ventura, afirmando que o “Chega é intransigente na condenação de toda a violência”.
A pergunta de Jorge Pinto não mereceu resposta de Luís Montenegro, mas o Livre voltou à carga. “Há uma aproximação preocupante e clara à extrema-direita”, diz, frisando que o Governo diz querer comemorar datas importantes para o país mas adiou as celebrações do 25 de Abril e não celebrou o 1º de Maio”, diria mais tarde a deputada Filipa Pinto, numa intervenção na qual declarou que “a Cultura está sob ataque”, com atores ou autores de livros a serem “alvo de perseguição”.
Filipa Pinto notou que Luís Montenegro assistido a esses ataques “infelizmente em silêncio” e que o Governo “desvaloriza o que se tem estado a passar”.
Nenhum dos apelos feitos pelo Livre levou Montenegro a falar sobre o tema.
Milícia alvo da PJ planeava invadir o ParlamentoEm conferência de imprensa, o diretor nacional da Polícia Judiciária, Luís Neves, frisou que na PJ estão “muito preocupados com o crescente desta atividade” de violência da extrema-direita, no dia em que o Expresso e o Now relevaram conversas do Movimento Armilar Lusitano sobre uma possível invasão ao Parlamento.
Segundo aqueles órgãos de comunicação social, alguns membros do Movimento Armilar Lusitano (MAL) falaram em canais fechados das redes sociais, como o Telegram, da hipótese de invadirem o Parlamento.
Manuela Santos, diretora da Unidade Nacional Contra-Terrorismo da PJ, revelou em conferência de imprensa que os suspeitos detidos esta terça-feira “estavam a armar-se” e a “recrutar pessoas” e a desenvolver “capacidade de treino tática para fazerem uma ação”, embora a polícia desconheça qual seria “mas que provavelmente estaria no seu horizonte”.
No que é descrito como uma “grande preparação”, a PJ detetou a realização de treinos com armas airsoft que esta polícia acredita destinarem-se a desencadear mais tarde uma ação criminosa, considerando Manuela Santos surpreendente a “qualidade, quantidade e diversidade” das armas apreendidas, algumas delas feitas com recurso a impressoras de 3D. “É a maior apreensão de armas 3D. É algo inédito em Portugal. É material caro, estamos a falar de muitos milhares de euros”.
Entre as apreensões há também cordão detonante, TNT, artigos explosivos, pistolas semiautomáticas e soqueiras.
“Houve encontros presenciais que nós acompanhamos, com elementos vindos de vários pontos do país. Temos muita informação sobre outras pessoas que integram esta estrutura”, disse Manuela Santos, explicando que alguns dos elementos do grupo pertencem a outras estruturas da extrema-direita entretanto desativadas, como a Nova Ordem Social, que era liderada por Mário Machado, que agora está à frente do Grupo 1143 e cumpre uma pena de prisão por crimes de incitamento ao ódio.
A PJ não descarta que haja no MAL mais membros ligados às forças de segurança ou militares, além do chefe da PSP que foi detido esta terça-feira.
Em termos nacionais, este será o maior grupo de extrema-direita identificado pela PJ com este tipo de capacidade de ação. A PJ acredita que “o grupo poderia, no entanto, contar com a ajuda de outros grupos satélites com as mesmas motivações”, apesar de não encontrar ligação com os ataques feitos aos atores de A Barraca nem aos voluntários que distribuíam comida a imigrantes no Porto.
Visao