Quinto leilão da ANP foi sucesso financeiro, mas revés para a segurança energética nacional

A sessão pública do 5º ciclo de Oferta Permanente da ANP superou os receios e, sob a perspectiva da arrecadação, foi satisfatório. No entanto, os resultados representam uma derrota para a segurança e soberania energética do Brasil.
A agenda regulatória em andamento no país, como a revisão do preço de referência do petróleo para o cálculo de royalties, a revisão da participação especial, o aumento do conteúdo local, as judicializações e as dificuldades de licenciamento ambiental relacionadas à bacia da Foz do Amazonas, juntamente com a queda do preço do barril de petróleo e o contexto geopolítico global, não representaram obstáculos aos interesses das petroleiras, sobretudo as multinacionais que arremataram a maioria das áreas em oferta.
Dos 172 blocos ofertados, 34 foram adquiridos por nove petroleiras. A Petrobras, como operadora, arrematou apenas oito blocos, sendo cinco na Bacia da Foz do Amazonas, em consórcio com a ExxonMobil, e três na Bacia de Pelotas, em consórcio com a Petrogal. A estatal também participa de um consórcio operado pela ExxonMobil, que detém outros cinco blocos na Foz do Amazonas. Assim, a Petrobras adquiriu apenas 37,6% das áreas arrematadas totais e 24,2% delas na condição de operadora. Trata-se de uma participação modesta no leilão, sobretudo considerando o fato de a estatal estar próxima de obter a licença para perfuração na Foz do Amazonas e, ainda, por não ampliar e diversificar de forma consistente seu portfólio exploratório para outras bacias do país.
A Chevron foi a protagonista do leilão ao arrematar como operadora nove blocos exploratórios em consórcio com a chinesa CNPC na bacia da Foz do Amazonas, o que representa 30,6% do total de áreas arrematadas e 53,1% das áreas arrematadas na Foz do Amazonas. Com isso, a multinacional, que desde meados de 2023 não produz petróleo e/ou gás natural no Brasil, demonstra possuir, como estratégia, a aquisição de áreas exploratórias de elevado potencial no país, como é o caso da Foz do Amazonas e de Pelotas, onde a petroleira adquiriu sozinha quinze blocos em 2023.
No pós-sal da Bacia de Santos, 11 blocos foram arrematados por petroleiras multinacionais que já possuem operações na região: Shell adquiriu 4 blocos, Karoon seis e a Equinor apenas um. Esse resultado reafirma o importante e persistente potencial exploratório da região nos próximos anos.
Na bacia do Parecis, única com blocos terrestres, apenas um dos 21 blocos disponíveis foi arrematado pela empresa brasileira Dillianz. Uma empresa estreante em rodadas licitatórias que possui atividades ligadas ao agronegócio, setor financeiro, imobiliário e energia fotovoltaica. Por sua vez, a bacia do Potiguar não recebeu ofertas por nenhum dos 16 blocos disponíveis.
Dois pontos merecem destaque no leilão. O primeiro refere-se à arrecadação recorde em bônus por assinatura e o segundo é o apetite da indústria pela Bacia de Foz do Amazonas, agora que a Petrobras está prestes a licenciar atividades exploratórias na região.
O valor arrecadado em bônus por assinatura no 5º Ciclo de Oferta Permanente de concessão foi de R$ 989,2 milhões. Trata-se da maior arrecadação em comparação aos ciclos anteriores, desde 2019. O valor é mais do que o dobro do registrado no 4º ciclo, que até então tinha sido o de maior arrecadação, com R$ 421,8 milhões. Esse valor atende aos interesses arrecadatórios de curto prazo do Estado brasileiro. No entanto, resulta de uma decisão sem diálogo social e açodada da ANP, além de representar o preço da venda da soberania energética do país para petroleiras multinacionais.
O elevado valor em bônus por assinatura está diretamente relacionado aos blocos arrematados na bacia da Foz do Amazonas. Ao todo, foram pagos pelas petroleiras R$ 844,3 milhões pelos 19 blocos arrematados na bacia. Esse valor isoladamente é duas vezes maior que o total arrecadado no 4º ciclo de OPC, e representa cerca de 85% da arrecadação total em bônus deste 5° ciclo.
Esses números em relação à Foz do Amazonas, demonstram o apetite das petroleiras, especialmente as major, pela bacia e, ao mesmo tempo, reafirmam seu elevado potencial. Estudos da EPE, estimam a possibilidade de reservas da ordem de 10 bilhões de barris recuperáveis na região. Logo, continuar abordando a Foz do Amazonas e as demais bacias da Margem Equatorial Brasileira como fronteira exploratória comum pode ser um passaporte para o país entregar seu potencial energético a interesses particulares, sem maiores compromissos com o desenvolvimento socioeconômico e ambiental das regiões Norte e Nordeste e do Brasil.
Assim, o resultado do leilão reforça a tese defendida pelo Ineep de que as bacias da Margem Equatorial brasileira precisam ser consideradas estratégicas, devendo, portanto, ser reguladas pelo regime de partilha. Essa medida asseguraria maior presença e controle do Estado sobre as operações de exploração, produção e as rendas petrolíferas, além de fortalecer a Petrobras como indutora do desenvolvimento social e econômico regional e nacional.
Em síntese, é fundamental que o Brasil amplie as atividades de óleo e gás para novas fronteiras, visando recompor suas reservas e garantir sua segurança energética futura. Contudo, esse movimento precisa ser realizado de forma coordenada, de modo a assegurar ganhos econômicos, sociais e ambientais para o povo brasileiro. Isso passa pela classificação da Margem Equatorial Brasileira como área estratégica e pelo fortalecimento da Petrobras, o que, no presente leilão, não foi realizado.
CartaCapital