Porque falhou o DOGE?

A 2 de junho, Zia Yusuf, presidente do Reform UK, tweetou que uma versão britânica do DOGE – o Departamento de Eficiência Governamental – tinha sido lançada. Prometendo uma redução do desperdício do Estado “ao estilo de Elon Musk”, a iniciativa faz eco da tentativa americana de aplicar a mentalidade empresarial de Silicon Valley ao sector público. Agora, com Musk a afastar-se do seu papel de consultor da administração Trump, vale a pena avaliar o que o DOGE realmente alcançou – e porque é que não cumpriu as suas ousadas promessas.
O DOGE dos EUA pretendia cortar 2 triliões de dólares em gastos públicos. Na prática, conseguiu apenas reduções de cerca de 170 mil milhões de dólares – apenas 8,5% da sua meta. Porque é que o DOGE se mostrou ineficiente?
A resposta está no pequeno livro, mas sempre relevante, ‘ Burocracia’ (1944), do economista austríaco Ludwig von Mises, que oferece uma visão fundamental: não é possível gerir um governo como se fosse uma empresa.
O governo não é um negócioA falha central da mentalidade DOGE não é o seu objectivo – reduzir o desperdício estatal é louvável –, mas a sua lógica. Os métodos que melhoram a eficiência do sector privado não se aplicam ao Estado. Como disse Mises:
Eficiência do estado e eficiência industrial são coisas completamente diferentes. A gestão de uma fábrica não pode ser melhorada tomando como modelo um departamento de polícia, e uma cobrança de impostos não pode tornar-se mais eficiente adoptando os métodos de uma fábrica de automóveis.
A razão é simples: o governo opera sem os sinais de lucro e/ou prejuízo. Nos negócios, se uma empresa produz algo de forma ineficiente, o mercado castiga-a – os consumidores deixam de comprar, os concorrentes ultrapassam-na e os prejuízos aumentam. Estes são os mecanismos através dos quais as empresas aprendem, se adaptam e se aperfeiçoam.
O Estado, por outro lado, não tem este ciclo de feedback. Não existe “cálculo económico” porque os serviços não são prestados através de troca voluntária. As agências públicas não ganham ou perdem com base na escolha do consumidor; são financiadas por impostos obrigatórios. Como argumentou Mises, isto significa que o Estado não pode confiar naquilo a que chamou “votos em dólares” para medir o seu sucesso. Não há teste de mercado.
Assim, a burocracia torna-se o único método racional para gerir as actividades do Estado. Mises define-a como “o método aplicado na condução de assuntos administrativos cujo resultado não tem valor monetário no mercado”.
Mesmo o empresário mais capaz, ao ser colocado à frente de um organismo governamental, deixa de ser um empresário e passa a ser um burocrata. As limitações do serviço público não são de gestão, mas institucionais. A ideia de que o Estado se pode tornar mais “eficiente” no sentido empresarial ignora esta diferença fundamental.
Não se pode simplesmente reduzir funcionários – deve-se cortar funçõesConclui-se, portanto, que a única verdadeira forma de melhorar o Estado é torná-lo mais pequeno, e não apenas mais “eficiente”. Foi aí que a DOGE falhou. Como observou Ryan Young, do Competitive Enterprise Institute: “A DOGE falhou porque errou na ordem das operações”.
Começaram por visar a folha de pagamentos salariais – cortando no pessoal – antes de reduzir o número ou o âmbito das agências federais. Isto significou que o mesmo aparelho burocrático continuou a funcionar, só que com menos funcionários. O resultado foi um aumento da disfunção, não da eficiência. Sem reduzir o que o Estado realmente faz, reduzir o pessoal é como encolher uma fábrica sem alterar os seus objetivos de produção. Não funciona.
Há outro perigo que o Reform deve evitar: ignorar a maior componente da despesa pública. Tanto Donald Trump como Nigel Farage prometeram proteger os programas de assistência social e de segurança social. Mas, ao fazê-lo, tornam a maior parte do orçamento intocável – ao mesmo tempo que prometem cortes maciços noutras áreas.
Poder-se-ia presumir que uma versão britânica de Trump cortaria a ajuda externa, mas esta é uma parte relativamente pequena do orçamento. No Reino Unido, a ajuda externa é frequentemente um alvo político, mas representa apenas 0,5% do Rendimento Nacional Bruto. Em contraste, as despesas com a segurança social representam 10% do PIB e a projeção é de que aumentem para 11,6% até 2026-27, de acordo com o Instituto de Estudos Fiscais. Como James Heale observou recentemente, “o Estado de bem-estar social é o novo campo de batalha de Nigel Farage”. Este é o verdadeiro campo de batalha fiscal.
Se o DOGE do Reino Unido seguir o modelo americano – cortando nas margens, mas deixando intactas as maiores áreas de despesa – corre o risco de repetir o mesmo fracasso.
A eficiência no Estado não pode ser imposta utilizando as métricas do mercado. O fracasso do DOGE não foi uma questão de força de vontade, mas de incompreensão da natureza do Estado. As tentativas de o fazer funcionar “como uma empresa” estão condenadas ao fracasso, a menos que abordemos a verdadeira questão: a dimensão e o âmbito do próprio Estado.
Nota editorial:
Mani Basharzad é um jornalista económico com trabalhos publicados pelo Adam Smith Institute e o Mises Institute, bem como entrevistas cobertas por think tanks globais como o Cato Institute. A sua investigação centra-se na economia liberal do desenvolvimento e no projecto de Hayek «Abuse of Reason». Apresenta também o podcast Humanomics. Tradução pela Oficina da Liberdade do artigo original de 05/jun/2025 publicado no CapX, pertencente ao britânico Centre for Policy Studies.
Os pontos de vista expressos pelos autores dos artigos publicados nesta coluna poderão não ser subscritos na íntegra pela totalidade dos membros da Oficina da Liberdade e não reflectem necessariamente uma posição da Oficina da Liberdade sobre os temas tratados. Apesar de terem uma maneira comum de ver o Estado, que querem pequeno, e o mundo, que querem livre, os membros da Oficina da Liberdade e os seus autores convidados nem sempre concordam, porém, na melhor forma de lá chegar.
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