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Apesar do progresso com os Comuneros del Sur, a 'paz total' entra em sua reta final em meio a dúvidas e incertezas.

Apesar do progresso com os Comuneros del Sur, a 'paz total' entra em sua reta final em meio a dúvidas e incertezas.
Pouco mais de um ano antes de o presidente Gustavo Petro deixar o cargo em Nariño, e em meio à escalada de derramamento de sangue no sudoeste do país e em outras regiões, fica claro que o ambicioso objetivo de "paz total" não será alcançado. Mesmo que o governo consiga consolidar os processos com a Frente Comuneros del Sur e a Coordenação Nacional do Exército Bolivariano – dois grupos dissidentes, o primeiro do ELN e o segundo das FARC –, o progresso finalmente alcançado, embora valioso, não parece suficiente para sustentar um balanço geral positivo.
As últimas duas semanas, de fato, resumem a política de paz deste governo: uma aposta carregada de anúncios, mas com poucos progressos tangíveis — embora haja alguns. Em 5 de junho, oito meses após o presidente Petro anunciar em Montería sua controversa ideia de reabrir as negociações com ex-paramilitares — vinte anos após o Acordo de Justiça e Paz — e de nomear 18 ex-líderes das Autodefesas Unidas da Colômbia (AUC) como mediadores da paz, 16 deles — aqueles ainda abrangidos por esse cargo — publicaram uma carta suspendendo suas funções, alegando suposto descumprimento por parte do Gabinete do Comissário para a Paz, liderado por Otty Patiño.
Em carta aberta, Salvatore Mancuso, Carlos Mario Jiménez (Macaco), Diego Fernando Murillo (Don Berna), entre outros, denunciaram "reiterados descumprimentos, atrasos sistemáticos e uma prejudicial falta de transparência" em seu relacionamento com o comissário, a quem acusaram inclusive de suposta "insubordinação" às ordens do presidente.

O presidente Gustavo Petro e o ex-líder paramilitar Salvatore Mancuso. Foto: Presidência

Dois dias depois, o próprio Patiño emitiu um comunicado afirmando que o processo de paz continua em vigor e que sua prioridade é estabelecer espaços para as vítimas, não estabelecer um fórum como o presidente pretendia. Este incidente evidenciou não apenas múltiplas dúvidas jurídicas sobre o uso indiscriminado do processo de paz, mas também tensões internas entre o Gabinete da Paz e o Centro Nacional de Memória Histórica, liderado por María Gaitán Valencia.
A crise, desencadeada mais por uma decisão política do presidente do que por decisões técnicas da Comissão, reflete, segundo Gersón Arias, pesquisador da Fundação Ideias pela Paz (FIP), a falta de método na implementação da principal política do Executivo.
"A interpretação é que há uma desconexão entre os anúncios do Presidente Petro e as entidades responsáveis ​​por tratar dessas questões, ou que o gabinete do Comissário não compreende os anúncios do presidente. Além disso, essa medida teve essencialmente um propósito político: interferir no cenário pré-eleitoral de 2026, em vez de fortalecer os direitos das vítimas e da sociedade", afirmou Arias.
Este escândalo eclodiu em meio a rumores persistentes sobre a possível saída de Patiño do cargo por motivos de saúde. Embora esses rumores tenham sido negados, sua prolongada ausência da agenda pública e o fato de ter tirado uma licença médica de 16 dias em abril – durante a qual foi substituído por sua mão direita, María Paz Lara – alimentaram as especulações. Somente em 7 de junho o gabinete do Comissário confirmou que Patiño havia sido submetido a uma cirurgia e estava em processo de recuperação.
Processos em crise
Das sete mesas-redondas estabelecidas no âmbito do acordo de "paz total", três apresentaram pouco progresso ou estão suspensas. O caso mais emblemático é o processo com o Exército de Libertação Nacional (ELN), suspenso pelo governo em janeiro após uma ofensiva deste grupo contra a 33ª Frente das FARC, que deixou mais de 130 mortos e quase 66 mil deslocados.
Desde então, houve apenas trocas de declarações — embora um canal de comunicação permaneça aberto. A mais recente ocorreu na quarta-feira, quando o ELN afirmou estar "sem interlocutor", ao que a delegação governamental, liderada por Vera Grabe, respondeu lembrando a todos que o processo está paralisado devido às ações do próprio grupo armado.
"A operação deles em Catatumbo deixou milhares de vítimas, e não houve nenhuma consideração ou reflexão sobre os efeitos de suas ações sobre a população e a paz", disse a delegação liderada por Grabe.

Vera Grabe, chefe da delegação governamental ao ELN. Foto: Milton Díaz. El Tiempo

Os processos de paz urbana — ou "espaços de diálogo sociojurídico", como o governo os chama — também avançaram pouco, principalmente por não terem um arcabouço jurídico que ofereça uma solução jurídica aos membros de organizações criminosas em Medellín, Quibdó e Buenaventura. A isso se soma uma sucessão de crises que enfraqueceu seu desenvolvimento.
Em Quibdó, por exemplo, não há trégua entre os grupos "Los Mexicanos", "Locos Yam" e "RPS" desde março. A chegada de Brenda Rentería como coordenadora da delegação governamental, em substituição a David Racero, gerou expectativas, mas sua saída, apenas dois meses depois, sem maiores explicações, confirmou o impasse. Medellín apresenta o progresso mais notável: os 12 grupos armados participantes do processo assinaram um compromisso para coibir a extorsão. No entanto, o processo avança em meio à desconfiança dos moradores do bairro e sem um diálogo efetivo com a Prefeitura e o Gabinete do Governador de Antioquia.
Além disso, embora existam resoluções para estabelecer espaços de diálogo com o "Clã do Golfo" e as Forças de Autodefesa da Serra, essas negociações ainda não começaram, e a posição do presidente Petro de retomar os bombardeios contra os primeiros indica que não haverá diálogo.
As zonas de localização
Atualmente, apenas três processos permanecem verdadeiramente ativos e realizam reuniões regulares: os realizados com os Comunardos do Sul, a Coordenação Nacional (surgida após a fragmentação da Segunda Marquetália) e o Estado-Maior dos Blocos e Frentes. Esta última estrutura inclui o Bloco Jorge Suárez Briceño (comandado por vulgo Calarcá), o Bloco Magdalena Medio (onde opera a 33ª Frente em Catatumbo) e a Frente Raúl Reyes.
Nestes três casos, o principal avanço foi a assinatura de acordos para o estabelecimento de Zonas de Localização Temporária (ZTTs), onde os membros desses grupos se concentrariam previamente. O acordo mais recente foi assinado na última terça-feira em Pasto, quando Royer Garzón, conhecido como Jairo, e Carlos Erazo assinaram um acordo para localizar aproximadamente 140 membros dos Comuneros del Sur no município de Mallama. O compromisso inclui a entrega de armas e a renúncia definitiva à luta armada.
No entanto, este acordo não foi isento de controvérsias. Moradores da região relataram supostas ligações entre os Comuneros do Sul e as Autodefesas Unidas de Nariño — uma organização paramilitar supostamente composta por membros deste grupo dissidente do ELN e responsável pelo assassinato do líder indígena Awá, Luis Aurelio Araujo, e de dois membros de sua equipe de segurança.

Armando Novoa e Walter Mendoza, porta-voz do Comitê Coordenador Nacional. Foto: Cortesia.

Três outras zonas de mobilização estão em processo de estabelecimento: duas com a Coordenação Nacional (em Roberto Payán, Nariño e em Putumayo) e outra com a Frente 33, liderada pelos pseudônimos Jhon Mechas e Richard. Este último processo é o único respaldado por decreto presidencial, que estabelece sua localização em Tibú e uma duração de sete meses.
A decisão de localizar a área em Tibú é arriscada, alerta Arias, porque é o epicentro do conflito com o ELN, onde não há garantias reais de segurança. Mas também porque é o lugar para onde muitas famílias que fugiram durante a primeira onda de violência estão retornando.
"Não se sabe se esses acordos realmente resultarão em um processo de desarmamento, o que aumenta a exposição das comunidades a possíveis represálias, tanto da 33ª Frente quanto do ELN", concluiu.
Embora este seja um passo significativo para este analista, também gerou críticas, já que, como sustenta Luis Fernando Trejos, professor da Universidade do Norte e pesquisador da paz, "esta situação é alcançada após enfrentar ataques militares de outros grupos armados, o que transforma essas áreas em uma espécie de tábua de salvação em caso de derrota militar".
Por outro lado, persiste a incerteza quanto às garantias de segurança tanto para os combatentes concentrados nas áreas de mobilização quanto para as comunidades vizinhas. Um dos temores crescentes é que outros grupos armados tentem entrar nesses territórios, o que poderia gerar novos surtos de violência.
"Também é importante esclarecer se os combatentes que chegam a essas áreas estarão armados ou entregarão suas armas a uma terceira parte neutra para posterior destruição. Isso é importante porque nos permite determinar se eles realmente se desmobilizarão ou se estão usando essas áreas para se proteger temporariamente de seus inimigos", acrescentou o pesquisador.
Em resposta a essa pergunta, Royer Garzón, porta-voz dos Comuneros del Sur, explicou em entrevista ao EL TIEMPO que o objetivo do acordo é avançar para a assinatura de um possível acordo de paz no futuro.

Material de guerra entregue em abril pelos Comuneros del Sur, Foto: Cortesia do OCCP

“Todas as zonas de implantação têm como objetivo a deposição ou destruição de armas. Uma zona de implantação temporária não pode ser concebida sem esse processo. Por um lado, já temos um acordo de destruição de armas, que continuaremos a implementar, e a Zona de Implantação nos permite progredir na deposição de armas, ainda que gradualmente”, afirmou.
A mudança de foco
A criação dessas zonas de assentamento não apenas reflete a intenção do governo de acelerar o processo, mas também uma mudança na abordagem do modelo de negociação. Historicamente, esses processos têm abrangência nacional, como foi o caso das negociações com as FARC, que deram origem a 16 sub-regiões prioritárias para a implementação de programas no âmbito do acordo de paz.
No entanto, hoje o Executivo parece focado em processos específicos onde pode acumular pequenas vitórias. O caso mais emblemático é o dos Comuneros del Sur, um grupo com no máximo 140 membros e presença limitada ao departamento de Nariño.
"A mudança de foco para questões territoriais se deve ao fracasso das mesas de negociação nacionais (ELN, Estado-Maior Central e Estado-Maior de Blocos e Frentes), nas quais o governo nacional investiu grande parte de seu capital político, pois esses eram os pilares centrais da 'paz total'", acrescentou Trejos.

Otty Patiño, comissário de paz. Foto: Sergio Acero Yate. O TIEMPO

Esses resultados, embora não insignificantes, estão muito aquém da promessa de paz completa com a qual o Presidente Petro chegou ao poder. Soma-se a isso a desconexão entre os anúncios do presidente e a capacidade operacional do Estado — como evidenciado pelos esforços de paz — e a fragilidade jurídica e política de muitos desses processos.
Por enquanto, o comissário Patiño deve comparecer à Câmara dos Representantes nesta segunda-feira para prestar explicações sobre a implementação da política.
CAMILO A. CASTILLOEditor PolíticoX: (@camiloandres894)
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