Banir Smartphones das Escolas em Portugal?

Relativamente à proibição dos telemóveis nas escolas, o Conselho de Ministros passou a recomendação emitida no início do ano letivo que agora termina para letra de lei, isto é, o Governo decidiu efetivamente proibir a utilização dos telemóveis nas escolas por alunos do 1.º e 2.º Ciclo de Ensino. Qual o suporte científico para tal decisão?
Como suporte para tal decisão, a comunicação social refere um estudo que ainda não é público, efectuado junto de escolas que proibiram a utilização dos telemóveis. De facto, todas as notícias que lemos sobre o assunto apenas referiam a existência de “um estudo”, fornecendo apenas alguns dados que alegadamente servem para suportar a decisão, sem fornecer mais nenhuma informação, além de alguns dados comparativos.
Segundo o Ministro da Presidência declarou aos meios de comunicação social, o estudo foi desenvolvido pelo PLANAPP – Centro de Planeamento e Avaliação de Políticas Públicas. No entanto, pelo que conseguimos apurar, o estudo baseou-se num longo questionário – e de acordo com algumas fontes, “mal elaborado” – destinado a ser preenchido por Diretores e Chefes de Assistentes Operacionais, cujo preenchimento foi incentivado pela DGEstE (Direção Geral dos Estabelecimentos Escolares), não havendo informação sobre que escolas responderam ao inquérito – qual a dimensão e características da amostra – se foram inquiridas apenas as escolas que adotaram a proibição dos telemóveis de forma voluntária ou outras que não adoptaram a proibição.
Não foi divulgado o estudo, tão pouco o questionário em que se baseou, quem foram os seus autores, se o estudo foi alvo de revisão por pares, que escolas foram inquiridas, se houve escolas que não adotaram a proibição a funcionar como grupo de controlo para podermos comparar os resultados com as escolas que adotaram a proibição, e que indicadores passados e presentes foram usados para se afirmar que “metade das escolas que proibiram telemóveis registam ‘redução substancial’ de indisciplina e bullying”.
Importa ainda saber como se estabeleceu a correlação direta entre estes fatores. É que, por exemplo e hipoteticamente, não é por existirem mais crimes no verão e por se venderem mais gelados no verão, que podemos afirmar que o consumo de gelados é responsável pelo aumento da criminalidade no verão.
Por outro lado, por todas as escolas que temos andado nos últimos 3 anos, não tivemos uma, sequer, que tivesse dados objetivos sobre os casos de bullying no seu estabelecimento. Pelo que, na ausência das informações atrás referidas, tendemos a crer que a “redução substancial de […] bullying”, é um “achismo”.
Por fim, inquirir somente diretores e chefes de assistentes operacionais é ouvir apenas aqueles responsáveis pela decisão e pela implementação da medida. Parece-nos um pouco como decidir em causa própria. E a restante comunidade escolar, não foi ouvida porquê? E os professores? E os pais? E os alunos, os principais afetados pela medida? Continua-se a ignorar o seu direito a ser ouvido, como está consagrado na Convenção dos Direitos da Criança? Como esperamos que adiram à medida, se os adultos não querem que eles façam parte da solução?!
É, quanto a nós, necessária uma avaliação externa e independente – a PLANAPP e a DGEstE são organismos do Estado – para garantir a imparcialidade dos resultados.
De referir que não somos a favor do uso indiscriminado e sem regras dos telemóveis nas escolas. Não concordamos é com a opção pela proibição pura e dura, sobretudo sem ouvir os principais afetados pela decisão, os alunos.
Fica ainda por saber como será implementada a medida, o que, segundo o Ministério da Educação e Ciência, ficaremos a saber para a semana.
Por fim, o Ministro da Educação e Ciência tem afirmado publicamente que preza as decisões suportadas com base na ciência. Esta falta de transparência não nos parece a melhor maneira de definir políticas com base na ciência.
* Cofundadores do projeto Agarrados à Net
observador