Discurso ricos x pobres: ao longo da história, isso nunca acabou bem

O governo brasileiro gasta mais do que arrecada e não parece disposto a fazer os cortes necessários para equilibrar as contas públicas. Mesmo com a maior carga tributária em 15 anos, a solução apresentada pela equipe econômica foi fazer a população pagar mais impostos.
Um exemplo dessa política foi o recente decreto assinado pelo presidente Lula a toque de caixa autorizando o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). A decisão, porém, foi derrubada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e está suspensa.
Para fugir da imagem de descontrole fiscal, a equipe econômica tem insistido em propostas de taxação dos super-ricos, argumento que vem sendo debatido no mercado. O problema é que Lula tem reiterado o discurso de que essa é uma disputa entre pobres e ricos — uma retórica antiga, de raiz marxista, que historicamente mostrou resultados desastrosos.
Casos como Argentina, Venezuela e a Alemanha nazista ilustram os riscos dessa narrativa. Adolf Hitler, por exemplo, apresentava-se como defensor dos operários, mas mantinha alianças com grandes empresas como Bayer, BMW, Siemens e Hugo Boss, que prosperaram durante o regime.
No Brasil, o presidente Lula busca consolidar cada vez mais a imagem de “pais dos pobres” e diz que os ricos são o problema, ao mesmo tempo em que declarou à Justiça Eleitoral ter um patrimônio de R$ 7,4 milhões em 2022. Além disso, o gabinete da sua esposa, Janja, que não ocupa nenhum cargo eletivo, custa cerca de R$ 2 milhões ao ano aos cofres públicos.
“Historicamente, a polarização entre classes sempre aparece em momentos de tensão fiscal ou grandes reformas. É uma narrativa com forte apelo popular, mas que muitas vezes desvia o foco da discussão. Isso afeta diretamente o ambiente de investimentos no país, e acaba penalizando inclusive o pequeno investidor”, afirma Fábio Murad, economista e CEO da Super-ETF Educação.
A narrativa da luta de classes também se mostra frágil do ponto de vista econômico. A proposta de aumento do IOF tem gerado dúvidas e confusão entre as pessoas. Murad explica que o projeto do governo que eleva o IOF para empresas com faturamento acima de R$ 6 milhões está focado em operações com títulos e valores mobiliários.
“A legislação do IOF é ampla e pode ser ajustada por decreto, o que deixa margem para futuras mudanças que impactem também pessoas físicas. O imposto incide sobre várias transações do cotidiano financeiro, como câmbio, crédito, seguros e até operações do cheque especial e investimento fora do país via corretoras internacionais”, diz.
Para além das questões financeiras e ideológicas, a luta de classes tem se mostrado perigosa. Exemplo disso foram os ataques a uma criança de cinco anos na internet com um professor sugerindo “guilhotina” à menina por usar uma bolsa de R$ 14 mil.
Outro caso emblemático foi a invasão de um banco no coração financeiro de São Paulo por integrantes do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto).
“Você pode me mostrar um único país no mundo onde a luta contra os ricos tenha levado à prosperidade para os pobres?”, questiona o historiador e sociólogo alemão Rainer Zitelmann, autor do livro How nations escape poverty (“Como nações escapam da pobreza”).
Com mais de 30 livros publicados e ferrenho crítico à filosofia do socialismo, Zitelmann estudou a economia de vários países e defende que um país só cresce quando há liberdade econômica. A liberdade para fazer negócios beneficia inclusive os mais pobres, uma vez que gera empregos e renda para toda a sociedade.
“O ódio aos ricos já destruiu muitos países. Políticos incompetentes estão sempre à procura de bodes expiatórios para os seus próprios fracassos. Em países socialistas como a Coreia do Norte e a Venezuela, as únicas pessoas ricas são os políticos corruptos”, disse Zitelmann em entrevista à Gazeta do Povo, no ano passado.
VenezuelaNo começo dos anos 1970, a Venezuela era um dos 20 países mais ricos do mundo e o mais rico da América Latina. Hoje, é o mais pobre da região, com 80% da população vivendo na pobreza, segundo o historiador Rainer Zitelmann. “Quase oito milhões de pessoas já fugiram de lá: é 30% da população!”.
O colapso começou quando Hugo Chavéz chegou ao poder, em 1999, com um discurso socialista e anti-imperialista. Disse que faria uma redistribuição de riqueza do petróleo para as camadas mais pobres da população. O discurso não só deu errado como o país entrou em uma crise econômica, social e política, com hiperinflação, sanções internacionais e cerceamento da liberdade.
Em 2013, com a morte de Chávez, Nicolás Maduro aprofundou o regime ditatorial. A Venezuela hoje é uma país mais pobre e mais desigual do que era. A burguesia antiga foi substituída por uma burguesia bolivariana, de pessoas leais ao ditador, e os pobres estão mais vulneráveis à escassez de alimentos e remédios.
ArgentinaHá um século, a Argentina estava entre os três países mais ricos do mundo, até que outro líder populista seguir a mesma cartilha e afundar o país. Com a promessa de cuidar dos necessitados, Juan Perón ocupou a presidência por três mandatos seguidos, de 1946 a 1974, e ao lado da esposa, Eva Perón, travou uma guerra contra os ricos.
Perón implementou direitos trabalhistas para o país, como aumento do salário mínimo e redução da jornada, porém, sem sustentação fiscal, o resultado foi inflação desenfreada. Ele também nacionalizou ferrovias, empresas de energia e comunicação.
Entre 1946 e 1949, os gastos públicos triplicaram e o funcionalismo cresceu mais de 50% entre 1945 e 1955, segundo Zitelmann. Muitos desses empregos foram criados para beneficiar aliados do Partido Justicialista.
AlemanhaNa Alemanha nazista, Hitler vendia a imagem de protetor dos operários e adversário da burguesia. Mas, apesar do discurso anticapitalista, fazia negócios com grandes empresários e industriais alemães, que inclusive bancaram o regime.
Zitelmann traz em seu outro livro, “Hitler: Anticapitalista e antirevolucionário”, discursos, artigos de jornais, registros do partido nazista que mostram como o ditador manipulava a narrativa para mobilizar as massas e conseguir acordos comerciais. Em troca de apoio e investimento ao nazismo, os empresários eram beneficiados pela “lealdade”.
Hitler acusava os judeus de levarem o marxismo à Alemanha e, por isso, eram os responsáveis por todos os problemas no país. A divisão de classes que começou com leis discriminatórias para bloquear e confiscar os bens dos judeus acabou no maior genocídio da História.
Segundo a revista Aventuras na História, um estudo feito pelo Ministério das Finanças alemão revelou que 30% do esforço de guerra alemão foi pago com dinheiro roubado dos judeus. Alguns que conseguiram deixar a Alemanha antes do Holocausto tiveram grande parte de sua riqueza confiscada através de um “imposto de saída”.
Coreia do NorteA Coreia do Norte se intitula como uma economia socialista independente, mas é altamente centralizada e controlada pelo Estado. O governo exerce controle total sobre a sociedade e é dona da maior parte dos meios de produção no país. As práticas do líder Kim Jong-un se assemelham mais ao regime de ditadura ou à monarquia absolutista.
O país é dividido por castas, conforme o histórico familiar de lealdade com o governo. Os mais “confiáveis” vivem nos melhores bairros, têm acesso às melhores escolas e hospitais. Os mais pobres ficam afastados, trabalham em minas e serviços brutos e não podem nem chegar perto da casta mais alta.
Além do controle e divisão social desde o nascimento, os norte-coreanos enfrentam escassez, infraestrutura precária e isolamento internacional.
NoruegaSomente em 2022, mais de 30 bilionários e multimilionários (mais do que o total dos 13 anos anteriores) deixaram a Noruega após o governo de centro-esquerda aumentar os impostos sobre a riqueza para 1,1%, apesar dos avisos de que a medida “desencadearia fuga de capital e ameaçaria a criação de empregos”. Muitos se mudaram para a Suíça, onde os impostos são mais baixos.
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