MAL: Soam os alarmes sobre o aumento da violência de extrema-direita

A Polícia Judiciária (PJ) deteve, esta terça-feira, seis pessoas por ligações ao grupo de extrema-direita e neonazi Movimento Armilar Lusitano (MAL), uma milícia fortemente armada, que segundo o comunicado da PJ “pretendia constituir-se como um movimento político”. As detenções ocorreram por estar “fortemente indiciadas” a prática dos crimes de infrações relacionadas com grupo e atividades terroristas, discriminação e incitamento ao ódio e à violência e detenção de arma proibida. Entre os detidos está um chefe da PSP que tinha já sido transferido para a Polícia Municipal de Lisboa por ligações à extrema-direita. E há vários sinais de que há motivos para alarme com uma onda de crescimento do ódio e da extrema-direita.
Treino armado e recrutamento nas forças de segurançaEste chefe da PSP era, segundo o Expresso, o responsável pelo recrutamento de novos elementos para o MAL, quer através de questionários online, quer através de entrevistas presenciais, nas quais o manejo de armas era fator preferencial para a adesão ao grupo, que estava já a receber treino de tipo militar com armas airsoft.
Manuela Santos, diretora da Unidade Nacional Contra-Terrorismo da PJ, revelou, em conferência de imprensa, que os suspeitos detidos esta terça-feira “estavam a armar-se” e a “recrutar pessoas” e a desenvolver “capacidade de treino tática para fazerem uma ação”, embora a polícia desconheça qual seria, “mas que provavelmente estaria no seu horizonte”.
Segundo foi noticiado, em conversas no Telegram estaria a ser pensada uma invasão do Parlamento, embora a PJ não tenha encontrado um plano operacional já desenhado para esse ataque.
“Muitos milhares de euros” para fazer armasNo que é descrito como uma “grande preparação”, a PJ detetou a realização de treinos com armas airsoft que esta polícia acredita destinarem-se a desencadear mais tarde uma ação criminosa, considerando Manuela Santos surpreendente a “qualidade, quantidade e diversidade” das armas apreendidas, algumas delas feitas com recurso a impressoras de 3D. “É a maior apreensão de armas 3D. É algo inédito em Portugal. É material caro, estamos a falar de muitos milhares de euros”. Embora cada arma possa ficar entre 100 a 200 euros, a impressora usada para as fabricar é um investimento caro e que demonstra a capacidade de financiamento que o grupo teria.
Entre as apreensões há também cordão detonante, TNT, artigos explosivos, pistolas semiautomáticas e soqueiras.
“Houve encontros presenciais que nós acompanhámos, com elementos vindos de vários pontos do País. Temos muita informação sobre outras pessoas que integram esta estrutura”, disse Manuela Santos, explicando que alguns dos elementos do grupo pertencem a outras estruturas da extrema-direita entretanto desativadas, como a Nova Ordem Social, que era liderada por Mário Machado, que agora está à frente do Grupo 1143 e cumpre uma pena de prisão por crimes de incitamento ao ódio.
A PJ não descarta que haja no MAL mais membros ligados às forças de segurança ou militares, além do chefe da PSP que foi detido.
Em termos nacionais, este será o maior grupo de extrema-direita identificado pela PJ com este tipo de capacidade de ação. A PJ acredita que “o grupo poderia, no entanto, contar com a ajuda de outros grupos satélites com as mesmas motivações”, apesar de não encontrar ligação com os ataques feitos aos atores de A Barraca nem aos voluntários que distribuíam comida a imigrantes no Porto.
Chega diz que não é preciso temer o fascismoAlém do Telegram, o MAL tinha também atividade no Facebook, num grupo para o qual só era possível entrar por convite e do qual fazia parte Manuel Matias, membro do Chega e pai da deputada Rita Matias.
Apesar disso, Manuel Matias já se distanciou do MAL em declarações ao Observador. “Não conheço esse grupo. Estou em milhares de grupos. Não estou a dizer que estou ou não estou. Agora, quem conhece a minha vida pública e política sabe que eu estou nas antípodas desse tipo de movimentos”, disse àquele jornal, afirmando não saber se chegou ou não a fazer alguma publicação nesse grupo.
“Só vendo. Nós fazíamos publicações em grupos próximos de algumas coisas do Chega”, respondeu, garantindo, porém, estar “no lado oposto desse tipo de posições”.
Apesar disso, e numa altura em que no Parlamento o Livre levou o tema do aumento da violência de extrema-direita para o debate do Programa de Governo, André Ventura aproveitou para falar aos que temem o regresso do fascismo. Sem nunca assumir o Chega como fascista, acabou, contudo, por dizer que não há que temer o regresso do fascismo.
“Que ninguém tema, quem não roubou o País não tem nada a temer do Chega nem do movimento que leva o Chega para a frente”, declarou André Ventura, esta quarta-feira, no debate da moção de rejeição do Programa de Governo apresentada pelo PCP. Que movimento “leva o Chega para a frente”? Ventura não o nomeou, dizendo apenas que “só quer pedir responsabilidades um a um”.
Conselho da Europa preocupado com discurso de ódioDe resto, André Ventura insurgiu-se contra o Conselho da Europa que emitiu um alerta sobre o aumento do discurso de ódio em Portugal, acusando-o de ser uma instituição que só serve para “distribuir tachos internacionalmente”.
Num relatório publicado esta quarta-feira, os peritos da Comissão Europeia Contra o Racismo e a Intolerância manifestam profunda preocupação com os casos de violência racista, motivada pelo ódio, notando que há uma banalização de uma retórica xenófoba que tem como principais vítimas os migrantes, as pessoas ciganas, as LGBTI e as negras.
“O discurso anti-imigrante é predominante nas discussões políticas, nomeadamente através da disseminação de desinformação que associa os migrantes à criminalidade ou a um fardo para o sistema de segurança social português”, afirmam os especialistas. O relatório refere também que continua a haver relatos de abuso racista, que incluem discriminação racial por parte da própria polícia.
Segundo as Estatísticas da Justiça, divulgadas pelo Público, os crimes de discriminação e incitamento ao ódio e à violência aumentaram mais de 200% nos últimos cinco anos.
Visao